A PÓLIS E O NASCIMENTO DA FILOSOFIA
·
O declínio do mundo dos mitos
Na
história do pensamento ocidental, a filosofia nasce na Grécia entre os séculos
VII e VI a.C., promovendo a passagem do
saber mítico (alegórico) ao pensamento racional (logos). Essa passagem ocorreu,
no entanto, durante longo processo histórico, sem um rompimento brusco e
imediato com as formas de conhecimentos utilizadas no passado.
· O
exercício da razão na pólis grega
O momento
histórico da Grécia Antiga em que se afirma a utilização do logos (a razão)
para resolver os problemas da vida está vinculado ao surgimento da pólis,
cidade-Estado grega. A pólis foi uma
nova forma de organização social e política desenvolvida entre os séculos VIII
e VI a.c. Nela, eram os cidadãos que dirigiam os destinos da cidade. Como
criação dos cidadãos, e não dos deuses, a pólis
estava organizada e podia ser explicada de forma racional, isto é, se
acordo com a razão.
A prática constante da discussão política
em praça pública pelos cidadãos fez com que, com o tempo, o raciocínio bem
formulado e convincente, se tornasse o modo adotado para se pensar sobre todas
as coisas, não só as questões políticas.
·
FILÓSOFOS
PRÉ – SOCRÁTICOS
De acordo
com a tradição histórica, a fase inaugural da filosofia grega é conhecida como
período pré-socrático. Esse período abrange o conjunto das reflexões
filosóficas desenvolvidas desde Tales de Mileto (623-546 a.C.) até Sócrates
(468-399 a.C.).
O objetivo
dos primeiro filósofos era construir uma cosmologia (explicação racional e
sistemática das características do universo) que substituísse a antiga
cosmogonia e teogonia (explicação sobre a origem do universo baseada nos
mitos).Em outras palavras, os primeiros filósofos queriam descobrir, com base
na razão e não na mitologia, o princípio substancial (a arché) existente em
todos os seres materiais. Para tanto, procuraram um princípio a partir do qual
se pudesse extrair explicações para os fenômenos da natureza. Um princípio
único e fundamental que permanecesse estável junto ao sucessivo vir-a-ser.
·
Os pensadores de Mileto: a busca da substância
primordial
Quando
afirmamos que a filosofia nasceu na Grécia, devemos tornar essa afirmação mais
precisa. Afinal, nunca houve, na Antiguidade, um Estado grego unificado. O que
chamamos de Grécia nada mais é o que chamamos de cidade-Estado (um conjunto de
muitas cidades gregas), independentes uma das outras, e muitas vezes rivais.
No vasto
mundo grego, a filosofia teve como berço a cidade de Mileto, situada na Jônia,
litoral ocidental da Ásia Menor. A cidade de Mileto abrigou três primeiros
pensadores da história ocidental a quem atribuímos a denominação filósofos. São
eles: Tales, Anaximandro e Anaxímenes.
Tales vai
dizer que o princípio de tudo é a água; Anaximandro, o infinito indeterminado
(Ápeiron), Anaxímenes, o ar;
- Tales de Mileto ( Tudo é água )
Procurando fugir das antigas explicações
mitológicas sobre a criação do mundo, Tales queria descobrir um elemento físico
que fosse constante em todas as coisas. Algo que fosse o princípio unificador
de todos os seres. Inspirando-se provavelmente em concepções egípcias, acresci
das de suas próprias observações da vida animal e vegetal, concluiu que a água
é a substância primordial, a origem única de todas as coisas. Para ele, somente
a água permanece basicamente a mesma, em todas as transformações dos corpos,
apesar de assumir diferentes estados: sólido, líquido ou gasoso.
- Anaximandro de Mileto (o indeterminado)
Anaximandro (610-547 a.C.) procurou aprofundar as concepções de
Tales sobre a origem única de todas as coisas. Em meio a tantos elementos
observáveis no mundo natural — a água, o fogo, o ar etc. —, ele acreditava não
ser possível eleger uma única substância material como princípio primordial de
todos os seres, a arché. Para Anaximandro, esse princípio era algo que
transcendia os limites do observável, ou seja, daquilo que não se situa numa
realidade ao alcance dos sentidos. Por isso, denominou-o ápeiron, termo grego
que significa o indeterminado, o infinito. O ápeiron seria uma "massa
geradora" dos seres, contendo em si todos os elementos contrários.
- Anaxímenes de Mileto ( tudo é ar)
Anaxímenes
(588-524 a.C) admitia que a origem de todas as coisas é
indeterminada. Entretanto, recusava-se a atribuir-lhe o caráter oculto de
elemento situado fora dos
limites da observação e da
experiência sensível. Tentando uma possível conciliação entre as concepções de
Tales e as de Anaximandro, concluiu ser o ar o princípio de todas as coisas.
Isso porque o ar representa um elemento invisível e imponderável, quase
inobservável e, no entanto, observável: o ar é a própria vida, a força vital, a
divindade que "anima" o mundo, aquilo que dá testemunho à respiração.
- Pitágoras de Samos ( culto a matemática)
Pitágoras (570-490 a.C., aproximadamente) nasceu na
ilha de Samos, na costa jônica, não distante de Mileto. Por volta de 530 a.C,
sofreu perseguição política por causa de
suas ideias, sendo obrigado a deixar sua terra de origem. Para Pitágoras, a essência de todas as coisas reside nos números, os
quais representam a ordem e a harmonia. Assim, a essência dos seres, a arché,
teria uma estrutura matemática da qual derivariam problemas como: finito e
infinito, par e impar, unidade e multiplicidade, reta e curva, círculo e
quadrado etc. Pitágoras dizia que no fundo de todas as coisas a diferença entre
os seres consiste essencialmente, em uma questão de números.
- Heráclito ( o movimento perpétuo do mundo)
Heráclito é considerado o primeiro grande
representante do pensamento dialético. Concebia a realidade do mundo como algo
dinâmico, em permanente transformação. Daí sua escola filosófica ser chamada de
mobilista (de movimento). Para ele, a vida era um fluxo constante, impulsionado
pela luta de forças contrárias: a ordem e a desordem, o bem e o mal, o belo e o
feio, a construção e a destruição, a justiça e a Injustiça, o racional e o
irracional, a alegria e a tristeza etc. Assim, afirmava que "a luta
(guerra) é a mãe, rainha e princípio de todas as coisas". É pela luta
das forças opostas que o mundo se
modifica e evolui. Atribuem se a Heráclito frases marcantes, de sentido
simbólico, utilizadas para ilustrar sua concepção sobre o fluxo e movimentação
das coisas, o constante vir-a-ser, a eterna mudança, também chamada devir: “Não
podemos entrar duas vezes no mesmo rio, pois suas águas se renovam a cada
instante”. Não tocamos duas vezes o mesmo ser, pois este modifica continuamente
sua condição.
Assim, Heráclito imaginava a realidade dinâmica do
mundo sob a forma de fogo ( arché), com chamas vivas e eternas, governando o
constante movimento dos seres.
·
O INÍCIO DOS ESTUDOS SOBRE O SER E O CONHECER
As discussões sobre os contrários,
sobre o ser e não ser, que iniciaram a lógica ( estudos sobre o conhecer) e a
ontologia ( estudos sobre o ser) e suas relações recíprocas, conforme veremos a
seguir.
- Parmênides de Eleia ( o ente é, pois
é ser e nada não é)
Parmênides
defendia a existência de dois caminhos para a compreensão da realidade. O
primeiro é o da filosofia, da razão, da essência. O segundo é o da crendice, da
opinião pessoal, da aparência enganosa, que ele considerava a "via de
Heráclito".
Segundo Parmênides, o caminho da
essência nos afirma, por exemplo, que na realidade:
a) existe o ser, e não é concebível sua
não-existência;
b) o ser é; o não-ser não é.
Em vista disso, Parmênides é considerado
o primeiro filósofo a formular os princípios lógicos de identidade e de
não-contradição, desenvolvidos depois por Aristóteles (ver estudos sobre noções
de lógica).
- Zenão de
Eleia
Discípulo
de Parmênides, Zenão de Eléia (488-430 a.C.) elaborou argumentos para defender
a doutrina de seu mestre. Com eles pretendia demonstrar que a própria noção de
movimento era inviável e contraditória.
-
Empédocles ( quatro elementos primordiais )
Nascido em
Agrigento (ou Acragas), sul da Sicília, Empédocles (490-430 a.C,
aproximadamente) esforçou-se por conciliar as concepções de Parmênides e
Heráclito. Defendia a existência de quatro elementos primordiais, que
constituem as raízes de todas as coisas percebidas: o fogo, a terra, a água e o
ar. Esses elementos são movidos e misturados de diferentes maneiras em função
de dois princípios universais opostos:
• o amor (philia, em grego): responsável
pela força de atração e união e pelo movimento de crescente harmonização das
coisas;
• o ódio (neikos, em grego): responsável
pela força de repulsão e desagregação e pelo movimento de decadência,
dissolução e separação das coisas.
Para ele,
todas as coisas existentes na realidade estão submetidas às forças cíclicas
desses dois princípios.
-
Demócrito ( o átomo)
Responsável
pelo desenvolvimento do atomismo, Demócrito afirmava que todas as coisas que
formam a realidade são constituídas por partículas invisíveis e indivisíveis.
Essas partículas foram chamadas de átomos, termo grego que significa
"não-divisível" {a = negação; tomo = divisível). A principal
contribuição traga pelo atomismo de Demócrito à história do pensamento é a
concepção mecanicista segundo a qual "tudo o que existe no universo nasce
do acaso ou da necessidade". Isto é, "nada nasce do nada, nada
retorna ao nada". Tudo tem uma causa. E os átomos são a causa última do
mundo.